Vampyro

Luiz A G Cancello

Melhor; combatermos à sombra.
Queimou o fusível, apagou a luz.
Neste escuro, o mundo indiviso;
Eu quase só,
sem minhas circunstâncias,
sem picadeiro.
Aparece o meu vampyro.
Assim mesmo, com “Y”,
íntimo estrangeiro.
Um ser dos limites;
entre ave e mamífero,
entre homem e bicho,
entre os vivos e os mortos.
Sem cruz, alho ou estaca
espero na sombra.
Só a gravidade me diz
onde é embaixo ou em cima.
Ele vem;
No escuro, o sangue não tem cor,
é apenas um líquido escorreito
de mim para ele,
e talvez dele para mim.
O ser umbroso.
Dentes na garganta,
as asas batem-me nas costas.
Padeço a terrível sensação:
os filamentos são chicotes
lanhando a alma,
no contacto das duas naturezas:
a pele e essas asas,
diferentes e a mesma.
Depois que ele se vai,
quedo ali, com uma estranha nostalgia.
Parado, encolhido,
ambíguo quanto à sua volta
fascinante.
Postado para sempre na sombra,
em eterna espera.

1984