O romance “O Livro do Destino” acontece no Irã. A trama se inicia ainda no regime do Xá Reza Pahlavi, passa por sua destituição pela Revolução Islâmica de 1979, segue pela guerra Irã-Iraque, que durou de 1980 a 1988, e vai além. A autora consegue, de forma admirável, concatenar diversos temas: o papel subalterno e humilhante da mulher no país, as consequências dos conflitos sociais na vida privada, a amizade entre duas mulheres, o funcionamento de diferentes famílias iranianas, o papel da religião nas casas e na sociedade, a ambiguidade entre a tradição e a ocidentalização dos costumes.
O romance descreve a vida de Massoum, sempre às voltas com o conflito entre seu papel de filha, esposa e mãe e seu desejo de estudar. Vinda de uma família típica, vê-se envolvida por uma paixão adolescente e proibida, depois pelo casamento com um revolucionário marxista. Em toda a sua vida está ligada à amiga Parvaneh, que vai percorrer outra trajetória, mais liberal e mundana, tentando sempre livrar a protagonista do destino comum às mulheres iranianas.
Massoum vai compreendendo as lutas políticas aos poucos, conforme vai escutando as conversas do marido com os companheiros de partido, estudando e enfrentando os problemas trazidos pela revolução e pela guerra. Nunca deixará de ser religiosa, mas terá sempre conflitos internos. Entende os objetivos do companheiro e de seus amigos revolucionários, mas tem como valor maior manter a família unida e dentro das tradições. Ao mesmo tempo revolta-se com as injustiças perpetradas contra as mulheres, lutando para ter direitos que lhe são negados. A mãe e os irmãos, fanáticos religiosos e severos ao extremo, representam o que há de mais retrógrado. Tendo de criar três filhos, acossada por forças diferentes e tentando conservar vivos seus sonhos, Massoum faz um esforço descomunal para manter-se viva.
O enredo é muito envolvente. A cada passo o leitor “torce” por Massoum, para que ela supere as dificuldades e consiga seus objetivos. Nem sempre estes serão alcançados, pois seria necessária uma força além da humana para tal. A menina, depois moça e mulher, faz o que pode com uma tenacidade admirável, mas há elementos na cultura iraniana que são de uma força e crueldade sem tamanho. É um livro intenso.
Contando a história do cotidiano de Massoum, a autora dá um panorama muito rico da vida no Irã, abrangendo vestuário, comida, costumes, religião e relações de parentesco e vizinhança. Uma história de amor permeia o livro; dizer mais que isso é antecipar as descobertas do leitor.