Apreciação rápida de Luiz A G Cancello
Acesse aqui a ficha técnica do filme.
Vejo pela primeira vez o filme Corra, Lola, corra, de 1998.
Lola recebe um telefonema do namorado, que está numa encrenca. Precisa arranjar 100.000 marcos em 20 minutos. Pensa, pessoas passam por sua mente, resolve procurar o pai. Joga o telefone para o alto. A trajetória do objeto, em câmera lenta, é conhecida. O osso que se transforma em espaçonave, em “2001 – Uma Odisseia no Espaço”, de Stanley Kubrick, faz o mesmo desenho.
O filme é uma ode ao fortuito. A cada momento abrem-se possibilidades. Um minuto de distração de um motorista, alguns segundos de atraso ao chegar no escritório do pai, um tropeção na escada, podem mudar o curso das coisas. A história se repete, e a cada vez o acaso dita um rumo diferente.
Faz muito tempo que li “O Jogo da Amarelinha”, de Cortazar. A associação com o filme foi imediata, mas não estou certo de que tenha fundamento. Se é que “ter fundamento” é importante neste contexto.
Lola grita. O grito que quebra cristais, derruba objetos, aflige as pessoas; tudo se paralisa, o tempo é suspenso. Grita em seu quarto, no escritório do pai, no cassino, ao jogar na roleta. Em cada um dos três episódios grita num lugar. O grito chama o Caos, opõe-se à Ordem humana implícita na trajetória que vai do osso à espaçonave.
O Acaso é um ser estranho, situa-se em algum lugar entre Ordem e Caos. Lola tem o poder de evocar as três instâncias, em sua corrida contra o Tempo. Para os românticos, o Amor – mesmo que ela o coloque em dúvida – é capaz de alterar os pilares do universo. Nem sempre dá certo, é verdade, e a falibilidade faz parte dos sentidos possíveis.
No início do filme há perguntas feitas por uma voz. Não se vê quem fala. “Onde estamos?” De onde viemos”, e indagações desse teor. A voz segue dizendo que cada pergunta levará a outras. E finaliza: “Não será sempre a mesma pergunta? E sempre a mesma resposta?” De todo jeito que o enredo se faça, chegaremos a um só ponto. Que lugar é esse? Lola o indetermina, pois só na incerteza, na abertura de infinitas alternativas, no vazio terrível da escolha, podemos nos acercar do entendimento. De quê? Não me perguntem. Talvez resposta seja sempre a mesma.
Pode não ser nada disso. Se o meu gato viesse pedir carinho antes de eu escrever, é possível que estas considerações fossem bem diferentes.